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Although Vinicius had established his public figure through poetry and popular song, he was one of the greatest prose writers of his generation. As a matter of fact, a generation where the good prose of that time was crystallized through a chronic genre extremely characterized by the style of Rio de Janeiro city.

 

With a large number of newspapers that circulated in the city and with a team of writers which would vary from Rubem Braga to Carlinhos de Oliveira, from Carlos Drummond de Andrade to Clarice Lispector, from Fernando Sabino to Nelson Rodrigues, Vinicius sit among them as a chronicler who transmitted to the prose, the same reasons and the same lightness of style that he presented to the public in his poems.

 


Poema de aniversário
Vinicius de Moraes
Poesia

POEMA DE ANIVERSÁRIO


Porque fizeste anos, Bem-Amada, e a asa do tempo roçou teus cabelos negros, e teus grandes olhos calmos miraram por um momento o inescrutável Norte...

Eu quisera dar-te, ademais dos beijos e das rosas, tudo o que nunca foi dado por um homem à sua Amada, eu que tão pouco te posso ofertar. Quisera dar-te, por exemplo, o instante em que nasci, marcado pela fatalidade de tua vinda. Verias, então, em mim, na transparência do meu peito, a sombra de tua forma anterior a ti mesma.

Quisera dar-te também o mar onde nadei menino, o tranquilo mar de ilha em que me perdia e em que mergulhava, e de onde trazia a forma elementar de tudo o que existe no espaço acima — estrelas mortas, meteoritos submersos, o plancto das galáxias, a placenta do Infinito.

E mais, quisera dar-te as minhas loucas carreiras à toa, por certo em premonitória busca de teus braços, e a vontade de grimpar tudo de alto, e transpor tudo de proibido, e os elásticos saltos dançarinos para alcançar folhas, aves, estrelas — e a ti mesma, luminosa Lucina, a derramar claridade em mim menino.

Ah, pudesse eu dar-te o meu primeiro medo e a minha primeira coragem; o meu primeiro medo à treva e a minha primeira coragem de enfrentá-la, e o primeiro arrepio sentido ao ser tocado de leve pela mão invisível da Morte.

E o que não daria eu para ofertar-te o instante em que, jazente e sozinho no mundo, enquanto soava em prece o cantochão da noite, vi tua forma emergir do meu flanco, e se esforçar, imensa ondina arquejante, para se desprender de mim; e eu te pari gritando, em meio a temporais desencadeados, roto e imundo do pó da terra. 

Gostaria de dar-te, Namorada, aquela madrugada em que, pela primeira vez, as brancas moléculas do papel diante de mim dilataram-se ante o mistério da poesia subitamente incorporada; e dá-la com tudo o que nela havia de silencioso e inefável — o pasmo das estrelas, o mudo assombro das casas, o murmúrio místico das árvores a se tocarem sob a Lua.

E também o instante anterior à tua vinda, quando, esperando-te chegar, relembrei-te adolescente naquela mesma cidade em que te reencontrava anos depois; e a certeza que tive, ao te olhar, da fatalidade insigne do nosso encontro, e de que eu estava, de um só golpe, perdido e salvo. 

Quisera dar-te, sobretudo, Amada minha, o instante da minha morte; e que ele fosse também o instante da tua morte, de modo que nós, por tanto tempo em vida separados, vivêssemos em nosso decesso uma só eternidade; e que nossos corpos fossem embalsamados e sepultados juntos e acima da terra; e que todos aqueles que ainda se vão amar pudessem ir mirar-nos em nosso último leito; e que sobre nossa lápide comum jazesse a estátua de um homem parindo uma mulher do seu flanco; e que nela houvesse apenas, como epitáfio, estes versos finais de uma canção que te dediquei:

                  ... dorme, que assim
                  dormirás um dia
                  na minha poesia
                  de um sono sem fim...

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