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AS MULHERES OCAS
Headpiece filled with straw.
T.S. Eliot, The Hollow Men
Nós somos as inorgânicas
Frias estátuas de talco
Com hálito de champanhe
E pernas de salto alto.
Nossa pele fluorescente
É doce e refrigerada
E em nossa conversa ausente
Tudo não quer dizer nada.
Nós somos as longilíneas
Lentas madonas de boate
Iluminamos as pistas
Com nossos rostos de opala.
Vamos em câmara lenta
Sem sorrir demasiado
E olhamos como sem ver
Com nossos olhos cromados.
Nós somos as sonolentas
Monjas do tédio inconsútil
Em nosso escuro convento
A ordem manda ser fútil
Fomos alunas bilíngues
De Sacré-Coeur e Sion
Mas adorar, só adoramos
A imagem do deus Mamon.
Nós somos as esotéricas
Filhas do Ouro com a Miséria
O gênio nos enfastia
E a estupidez nos diverte.
Amamos a vida fria
E tudo o que nos espelha
Na asséptica companhia
Dos nossos machos-de-abelha.
Nós somos as bailarinas
Pressagas do cataclismo
Dançando a dança da moda
Na corda bamba do abismo.
Mas nada nos incomoda
De vez que há sempre quem paga
O luxo de entrar na roda
Em Arpels ou Balenciaga.
Nós somos as grã-funestas
As onésimas letais*
Dormimos a nossa sesta
Em ataúdes de cristal
E só tiramos do rosto
Nossa máscara de cal
Para o drinque do sol-posto
Com o cronista social.
* Uma das categorias da nova gnomonia, de Jayme Ovalle, que classifica os seres e as coisas em: dantas, parás, mozarlescos, kernianos e onésimos, sendo estes conhecidos “pés-frios”. Para maiores esclarecimentos, ver o capítulo “A nova gnomonia”, em Crônicas da província do Brasil, de Manuel Bandeira.