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La femme à trent'ans

1 de Janeiro de1940

Jennifer Jones é uma mulherzinha adorável. Seu rosto, ingênuo e ardente a um tempo, tem uma qualidade qualquer índia que lhe empresta o que se poderia chamar de: simulacro de temperamento. Mas é impressão. Aquele olhinho puxado é puramente pseudo, e a face mongólica deve-se com certeza a algum pesadelo que a senhora mãe dela teve, que era prisioneira de Tamerlão.

Eu só sei dizer que a menina defende. Sua Canção de Bernardette fez época, ruim como era e tudo. Hollywood gostou de sua falta de talento e deu-lhe grandes papéis, de que ela se desincumbiu senão bem, pelo menos com louvável tenacidade. O fato é que Jennifer Jones pode ser comparada, com pouca desvantagem, às melhores atrizes americanas do cinema de agora, o que é de deixar o moral da pessoa meio baixo. Mas eu gosto dela. Não como atriz; como desenho de individualidade. São dessas coisas.

Em Madame Bovary, no entanto, Jennifer Jones me deu mais arrepios que uma raspada de unha em cal de parede. A única coisa que ela faz com uma certa desenvoltura é trocar de vestido. Em sua interpretação da grande Emma, talvez a mais patética das personagens de ficção, Jennifer perde-se completamente nas limitações de sua individualidade, e de seu estúdio, conseguindo por um lado manter a mesma expressão em todo o decorrer da película, e por outro trocar de roupa com uma rapidez e versatilidade que matariam de inveja a passada Fátima Miris, transformista insigne.

Na realidade, a impressão que se tem é que ninguém está sabendo bem do que se trata. Para que tanto fricote com uma mulherzinha burguesa com uma ânsia de viver, com uma verdadeira mania de mau passo? Por que é que ela não comete um crime qualquer de parceria com Arsène Lupin, e então se poderia encaixar Sherlock Holmes especialmente para resolver a parada?

O resultado é que a pobre Jennifer passa os dias de boca entreaberta, mostrando temperamento; mas a impressão que tive foi de que ela estava resfriadíssima, ou presa de grande dispnéia. A coadjuvá-la, existem vários galãs de nome, como Van Helflin e Louis Jourdan, e até o jovem Alf Kjellin, cuja atuação no filme sueco Hets (A tortura de um desejo) foi excelente. Mas Alf Kjellin agora se chama Christiano Kellen, adquiriu um ar de camundongo encartolado e positivamente não sabe o que há de fazer de si mesmo ou de Jennifer Jones, sempre a olhá-lo de boca entreaberta. Eu confesso que se uma senhora ficasse me olhando daquele modo, e com aquela insistência, eu daria um jeito para passar-lhe o lenço assim meio à baiana.

Na pele de Emma Bovary, Jennifer Jones não consegue se desembaraçar do fato de que é uma leading lady hollywoodiana, em todos os sentidos e conseqüentemente precisa fazer muita forcinha, muita forcinha mesmo. Isso, aliado ao seu grande encanto físico, é bastante simpático. Dá uma certa peninha dela, e por um momento a gente quase deseja vê-la integrada no papel que lhe foi atribuído. Tão bonitinha, tão ruinzinha. Enfim, cada um tem lá seus tico-ticos. Jennifer Jones tem mania de ser grande atriz: deixá-la... Seria pior se ela tivesse mania de saltar de bonde andando.

Gustave Flaubert aparece sob a figura de James Mason no falso julgamento que envolveu seu livro imortal. O filme, é claro, nasce como um flashback desse julgamento. Hollywood nunca perderia um chavão desses; ou muito me engano ou Flaubert parecia bastante a contragosto em toda aquela marmelada. Mason não é das personas gratas de Hollywood, na qual já desceu o malho mais de uma vez. Mas a gente nunca sabe. Ultimamente, tem aparecido com bastante mais freqüência nas colunas sociais da colônia, representadas por essas três adoráveis matronas, esses três deliciosos bicúspides, esses bibelôs de Sears que se chamam Edda Hoper, Louella Parsons e Edith Gwynn - três amores que ficariam ótimos assim deitadinhas, todas vestidinhas de branco com os olhinhos bem fechadinhos e uma velinha acesa na mão.