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Lembrete

Rio de Janeiro , 2004

A nunca esquecer: as manhãs 
Da infância, os pães alemães 
            A sala escura 

Na casa da rua Voluntários 
Da Pátria, lar de funcionários 
            Da prefeitura. 

A nunca esquecer: minha avó 
Prosternada (Deus e ela) só 
            Pele e ossos 

A tatalar silêncio e paz 
Nas consoantes labiais 
            Dos padre-nossos. 

A nunca esquecer: a carne negra 
O cheiro agreste, a pele íntegra 
            Nua na cama 

Nas justaposições mais pródigas 
Que menino não ama as nádegas 
            De sua ama? 

A nunca esquecer: as gavetas 
Velhas, à luz; as rendas pretas 
            As caixinhas 

E as sublimes fotografadas 
Mortas, mas ainda enamoradas 
            Ó tias minhas! 

A nunca esquecer: certa mulher 
Cuja face não posso mais ver 
            Em certo quarto 

A mergulhar minha cabeça 
Por entre a escuridão espessa 
            Do ventre farto. 

A nunca esquecer: o caso Sacco 
E Vanzetti nem Michel Zevaco 
            (Que o avô me deu!) 

Que este seria o quixotismo 
A arrebatar-me de ismo em ismo 
            A um: como o meu.